Como proteger seus equipamentos sem prejudicar a qualidade sonora

característico período de estiagem de chuvas, muito se torna a falar em racionamento de água e de energia elétrica. Nós, usuários dos serviços das empresas concessionárias de energia, ante a essas notícias e, ainda assombrados com o fantasma do “apagão” de 1999, começamos a nos questionar se os estimados ( e muitas vezes caríssimos) equipamentos de nossas configurações de áudio e vídeo, passam a ter sua saúde ameaçada pelas constantes interrupções de energia e possíveis “apagões”. Soma-se a isso o fato de vivermos em um país tropical, onde as tempestades quase sempre se apresentam de maneira severa e carregando consigo os temidos e assustadores relâmpagos.

Entretanto, mesmo estando expostos a todos esses infortúnios, há ainda grande parcela de amantes do A/V que negligencia a necessidade de investir na aquisição e instalação de sistemas de proteção para seus equipamentos. Em geral, essa relutância deve-se, não tanto a descrença ou altos custos envolvidos, mas principalmente pelo total desconhecimento dos perigos que podem adentrar em suas residências via rede elétrica .E essas pessoas igualmente desconhecem que tais sistemas podem, não raramente, conferir uma melhor qualidade na reprodução eletrônica do som.

Mas para entendermos o porque da necessidade ( e também dos benefícios) de tamanha proteção, necessário primeiro compreender o que acontece com a energia elétrica, desde sua geração nas usinas hidrelétricas até o momento em que penetra o interior de nossos equipamentos.

O caminho da energia elétrica e suas intempéries

A energia elétrica, na forma como a conhecemos e utilizamos em nossas casas, é gerada em usinas hidrelétricas através da transformação de energia mecânica em energia elétrica, ou seja, uma queda d’água atinge as pás de uma turbina, a qual entra em alta rotação e, assim como um dínamo, passa a gerar corrente e tensão elétricas, em freqüência de 60 hz. Essa medida de freqüência indica o número de ciclos da corrente elétrica, ou seja, quantas vezes por segundo os elétrons vem e vão . A energia elétrica obtida na saída dos geradores das usinas apresenta-se na forma mais pura possível e portanto, na condição ideal para ser utilizada. No entanto, durante o trajeto dessa energia, ao ser distribuída a fábricas, indústrias e residências, é angariada grande poluição, causada pela introdução na rede de harmônicos (múltiplos) da freqüência fundamental de 60 Hz. Esses harmônicos são geralmente provenientes de motores elétricos, transformadores, como também de todo e qualquer aparelho gerador de campo magnético indutivo. Como esse problema é comum a todos as partes do mundo ( obviamente agravado nos países menos desenvolvidos), os fabricantes de equipamentos eletrônicos instalam dentro de seus aparelhos fontes de energia, sobre as quais recai a responsabilidade de , não apenas fornecerem potência necessária ao funcionamento dos inúmeros circuitos internamente existentes, mas também a de entregarem essa potência na forma mais pura possível. Infelizmente, o grau de insalubridade da rede é tão alto que , mesmo em equipamentos de elevado padrão ( os chamados High End), essa filtragem não se mostra suficiente para eliminação de todos os harmônicos. Todavia, em que pese serem todos os equipamentos elétricos e eletrônicos afetados pela ocorrência de harmônicos, são os equipamentos destinados ao Áudio e Vídeo e informática os mais afetados por tal fenômeno, devido a sua grande sensibilidade a mínimas mudanças em sua alimentação energética. Portanto, para esses casos, necessário se faz a adoção de outros procedimentos.

Filtros, condicionadores e estabilizadores

Sabendo então da quantidade de “sujeira” presente em nossa rede elétrica, há de se questionar a existência de um antídoto para tal veneno. E ele existe: chama-se processo de filtragem adicional, o qual consiste na aplicação de dispositivos eletrônicos capazes de absorver e posteriormente eliminar esses harmônicos antes de chegarem a entrada de força dos equipamentos. No mercado existem diversos produtos capacitados a executar essa função, sendo os mais conhecidos aqueles destinados ao segmento de informática, abundantemente encontrados por preços que variam entre R$ 10,00 e R$ 100,00. São dispositivos semelhantes a extensões de tomadas múltiplas, só que trazendo internamente, um circuito eletrônico responsável pela filtragem da rede.

Todavia, mesmo sendo os equipamentos de informática ( como todo e qualquer equipamento eletrônico) sensíveis a ocorrência de harmônicos, são os destinados ao Áudio e Vídeo que demandam maiores cuidados, pois harmônicos, ao ultrapassarem a fonte interna dos equipamentos, passarão a percorrer os circuitos de áudio e vídeo, chegando aos estágios de pré e amplificação, como também aos de conversão de sinal, de maneira que essa “impureza” serão posteriormente traduzida na forma de distorções no áudio e na imagem. Portanto, para os equipamentos de A/V, necessário um processo de filtragem diferenciado do aplicado em informática. Para essa tarefa existem no mercado equipamentos destinados à filtragem da rede e dirigidos especificamente ao segmento de Áudio e Vídeo: os condicionadores de energia. As boas empresas do mercado especializadas em A/V oferecem várias opções de modelos, com preços variando de US$ 60,00 ( os mais simples) a US$ 1.500,00 ( os mais sofisticados). Esses produtos apresentam, dependendo do modelo, uma série de recursos, sendo um dos mais interessantes a proteção contra surtos e “spikes”. Os chamados surtos de sobretensão ocorrem geralmente após uma interrupção momentânea de energia. Quando o fornecimento de energia é restabelecido, a mesma retorna com muito mais intensidade, superando os limites de tolerância para a tensão nominal de 110 ou 220 volts, o que não raro causa grandes danos aos equipamentos. Dentre os tipos de surtos, os mais temidos são sem dúvida os “spikes”, definidos como surtos de ocorrência extremamente rápida ( na casa dos milésimos de segundo), trazendo consigo sobrecargas de tensão que chegam a ultrapassar os 6.000 Volts! As principais causas de “spikes” são tempestades elétricas, podendo igualmente ser causados por motores e geradores elétricos de alta potência. Condicionadores oferecem ainda proteção contra raios, proteção extensiva a entradas de antena e telefonia, ligação dos equipamentos alimentados ( após surto ou sobrecarga) de forma seqüencial e temporizada, saída de energia com identificação dos equipamentos a serem ligados e com carga previamente dimensionadas, dentre outros recursos. Mas o que realmente difere os condicionadores destinados ao A/V dos comuns filtros de linha é a forma de atuação do circuito de filtragem. Os chamados filtros de linha aplicados em informática atuam em série com a rede elétrica. Explicando melhor: imaginem um pequeno filtro instalado no meio de um fio condutor. A energia entra por uma lado, passa pelo filtro, e depois saí pelo outro lado. Acontece que em tal procedimento, o próprio filtro, logo após “limpar” a energia, acaba transferindo à ela harmônicos de 60 Hz. Obviamente, a sujeira introduzida pelo filtro já é muito menor do que a que ele mesmo eliminou na etapa de entrada, mas mesmo assim não deixa de ser um dispositivo “poluidor” da rede elétrica. Como solução para isso, os fabricantes conceberam filtros que atuam em paralelo com rede , pois em tal configuração ( assemelhada com um “T”), o circuito de filtragem retira da rede os nocivos harmônicos, sem no entanto reinjetá-los em seguida, pois sua conexão com a rede se dá apenas no estágio de entrada de energia, não existindo retorno. Toda a energia espúria acumulada e proveniente da rede é então canalizada e direcionada ao pólo de terra do condicionador. Quanto a mencionada proteção contra raios, vale aqui um comentário: raios são fenômenos de ocorrência aleatória e muitas vezes imprevisíveis, carregando consigo potências avassaladoras, podendo, em casos extremos, atingir valores da ordem de 100 milhões de Volts e 400.000 ampéres! Caso um raio atinja suas instalações elétricas, ou mesmo o perímetro de sua residência ( num raio de cerca de 10 m entre o local da queda e a posição de seus equipamentos) dificilmente o condicionador conseguirá proteger seus equipamentos, pois a DDP (Diferença de Potencial) gerada será extremamente elevada, literalmente fritando todos os componentes eletrônicos que se encontrarem no caminho. Mesmo as instalações domésticas de aterramento podem não se mostrar capaz de dissipar, com a necessária rapidez, tamanho poder destrutivo.

Obviamente, estamos falamos aqui da improvável (porém possível) circunstância de ser atingido quase que em cheio por um raio, pois em ocorrências normais, com os raios caindo a centenas ou milhares de metros, ou atingindo a rede elétrica em pontos relativamente distantes, o excesso de potência gerado será consumido através do baixo potencial resistivo do planeta, o qual é o menor possível, tendendo a zero, como também dissipado ao percorrer quilômetros de cabeamento. O energia que sobra e chega a nossas residências, embora ainda não seja pouca, pode ser assimilada e eliminada pelos equipamentos de proteção. Contudo, para estar-se totalmente protegido contra raios, só mesmo tendo à disposição um eficiente sistema de pára-raios. Mas insistimos que se trata de uma exceção, pois na grande maioria dos casos, os condicionadores darão conta do recado.

Outro ponto também deve-se ter em mente: condicionadores e estabilizadores de tensão são produtos completamente distintos, e assim, destinados a diferentes aplicações. Condicionadores efetuam a filtragem da rede, mas não estabilizam a tensão. Eles possuem uma faixa de tolerância de cerca de 15% para mais ou para menos em relação à tensão nominal da rede (110 ou 220). Excedido tal limite de tolerância, eles simplesmente desligam, interrompendo a alimentação aos equipamentos a eles conectados. Portanto, a tensão de entrada no condicionador, será igual a tensão fornecida aos equipamentos por ele alimentados. Em regiões propensas a grandes e constantes variações de tensão é aconselhável a utilização de um estabilizador, o qual deve sempre ser instalado entre a tomada de energia da parede e o condicionador, isto porque, sendo o principal componente do estabilizador um grande e potente transformador, o mesmo é um potencial gerador de harmônicos de 60 Hz. Mas não havendo real necessidade , o uso de estabilizadores deve ser desconsiderado.

Outro ponto que merece atenção é a instalação elétrica se sua residência. Independente da qualidade e sofisticação de seu sistema de proteção, as instalações elétricas de seu Home Theater necessitam estar em perfeita ordem. 99 % bom não é aceitável nesses casos. Procure dimensionar fios, cabos e tomadas de força acordo com as potências que lhes serão exigidas. O mal dimensionamento é o principal causador de superaquecimento de tomadas e fios, como também de curtos-circuitos. Consulte um eletricista de sua confiança para checar as condições de suas instalações elétricas. Dedique a essa etapa os mesmos cuidados observados quando da escolha de seus equipamentos, pois aqui não são admitidos erros. Também lembrem-se que, assim como as instalações, os condicionadores e estabilizadores devem ser capazes de “segurar” a potência consumida pelos equipamentos de A/V. Para calcular a potência final consumida pelo seu sistema, consulte o manual de instruções de seus equipamentos. Atenção para um detalhe: os fabricantes expressam valores diferenciados para potência gerada e consumida . Para efeito de cálculo, adotem sempre o número de maior valor.

A importância do aterramento

Já mencionamos que a energia espúria que adentra nossas residências via rede elétrica é direcionada ao fio de terra, mas para que isso seja verdade certas premissas devem ser observadas. Em primeiro lugar devemos entender o que é o aterramento ou fio terra. Dissemos que o potencial resistivo da Terra tende a zero, ou seja, é nulo, de maneira que nosso planeta absorve com grande facilidade várias formas de energia. Então nada mais natural do que encaminhar a energia indesejada para o terra. Isso, além de trazer grandes benefícios a nossos equipamentos é também ecologicamente correto!

Quando da execução de um aterramento, um erro comum ao menos experientes é conectar o terra ao neutro da tomada. Aqui vale uma nota: neutro e terra, embora ambos sejam aterrados (ligados ao solo), são coisas absolutamente diferentes. O neutro é o retorno da fase. Já o terra tem como função fornecer uma tensão de referência para a fase. Portanto, nunca deve-se interligar neutro e terra. Essa conexão pode trazer resultados desastrosos, pois caso haja interrupção no neutro, todos os equipamentos ficarão desprotegidos.

Necessário também observar que condicionadores de energia possuem cordão de força com tomadas de 3 pinos. Sendo assim, esses equipamentos são concebidos para trabalharem conectados a tomadas tripolares ( com aterramento). Sem a conexão com o terra, mesmo o mais caro e sofisticado dos condicionadores estará 50% debilitado na função de proteger seu HT. No entanto, conectar um condicionador à tomada com aterramento e os demais aparelhos de A/V às saídas de força dele não é o suficiente. Deve-se também conectar pelo menos um dos aparelhos de A/V ao pino de terra. Mas como fazer isso se as tomadas de força dos condicionadores possuem 3 pinos e a grande maioria dos aparelhos de A/V ( pelo menos os não High End) possuem tomadas de apenas 2 pinos? Para isso é preciso saber que todo aparelho eletrônico possui um terra interno, o qual corresponde ao terminal negativo das conexões de áudio e vídeo ( RCA, RF e caixas) e é dado pela caixa ou carcaça metálica do equipamento. Portanto, os terras internos de todos os equipamentos ( e suas carcaças) estão interligados através dos cabos de conexão. Isso significa que, aterrando um dos equipamentos (normalmente o receiver, por ser ele o centro de todas as conexões) estaremos automaticamente aterrando os demais. E como aterrar um receiver cujo cordão de força possui apenas 2 pinos? Simples: utilizando um fio flexível de boa qualidade, conecte a carcaça do receiver ao pino de terra correspondente na saída de força do condicionador. Essa conexão pode ser feita prendendo-se o citado fio a um parafuso da carcaça metálica do receiver ou ao terminal denominado Phono GND (normalmente destinados a toca-discos analógicos). Na ponta referente à tomada de aterramento, pode-se utilizar um conector do tipo “banana”. Lembre-se de isolar muito bem todas as conexões. Outra solução seria a de extrair a tomada de 2 pinos do cordão de força do receiver e substituí-la por outra com conexão para o terra ( 3 pinos), observando a conexão da carcaça do aparelho ao terra através dessa tomada. Para os possuidores de vários equipamentos já previamente dotados de tomadas com aterramento melhor se faz consultar um especialista no assunto, pois devido a um fenômeno denominado “loop de terra” é pouco recomendável conectar-se todos esses equipamentos ao fio de terra.

Obviamente tudo isso só será valido caso esteja disponível um sistema de aterramento eficiente, algo que pode ser providenciado ( para quem ainda não possui) junto a um eletricista de sua confiança. Desnecessário dizer que todas as conexões devem ser feitas com os aparelhos desligados da tomada, pois estaremos conectando os equipamentos eletricamente à Terra, o que sempre trás algum risco.

Para os adeptos do “faça você mesmo” e conhecedores da matéria, com um custo de cerca de R$ 200,00 é possível providenciar um bom aterramento, estando já computados nesse valor todos os materiais necessários (tomadas tripolares e seus respectivos acabamentos, fios, hastes de aterramento, etc.). Também convém distribuir o fio de aterramento por toda a instalação elétrica ( e não somente àquela que serve ao HT), pois outros produtos normalmente encontrados em nossas residências também podem se beneficiar dele. É o caso de freezeres, geladeiras, microondas e chuveiros. E não se esqueçam de verificar antecipadamente se nos conduites de energia existe espaço disponível para a passagem de mais um fio (no caso o destinado ao terra).

Outra boa medida a ser tomada é a contratação de um seguro residencial, o qual deve cobrir não apenas as instalações físicas da residência, mas também os equipamentos dentro dela instalados. Inúmeras seguradoras já oferecem esse serviço, o que , dependo do custo da configuração dos equipamentos, pode-se mostrar um investimento perfeitamente justificável.

Para finalizar, quando da ocorrência de fortes chuvas e tempestades com grande incidência de raios, em que pese o uso de sofisticados sistemas de proteção oferecidos pela moderna tecnologia, ainda vale lembrar do bom e velho conselho de nossos pais e avôs: desligue o aparelho e retire o cordão de força da tomada. “Seguro morreu de velho” diriam eles.

* texto originalmente publicado na revista HOME THEATER

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