Áudio: qual é a potência ideal?

A maioria das pessoas, quando vai comprar um receiver ou caixa acústica, dá muito valor à potência. Na verdade, essa especificação é apenas um dos critérios que devem ser levados em conta – e nem é o mais importante. O fato de ter alta potência não significa que um aparelho vai soar mais alto, nem melhor. O segredo está na boa integração entre receiver e caixas. Mas, para isso, é preciso entender bem o que significa potência.

Primeiro, vamos explicar o que aconteceu quando o mundo passou do som estéreo – que dominava o mercado até meados dos anos 80 – para o som multicanais. Com a popularização dos sistemas de home theater, os fabricantes viram-se diante de um dilema. Os usuários do estéreo estavam acostumados a altas potências, na faixa das centenas de watts para cada um dos dois canais. Mas, num sistema de cinco canais, é impossível construir amplificadores em escala comercial com esse nível de potência em todos os canais.

A solução – goste você ou não – foi fazer os receivers e amplificadores multicanais parecerem ter mais potência do que possuem de fato. É o que ocorre quando se lêem as especificações de um receiver: “X watts de potência contínua RMS a 8 ohms, com 20-20.000Hz e não mais do que X% THD, com todos os canais acionados”! Esta é uma especificação honesta, pois permite comparar de forma justa produtos de marcas diferentes.

Independentemente dos números, o importante é saber que a potência de um aparelho está sempre associada a outros parâmetros: sensibilidade (no caso da caixa acústica), resposta de freqüências (é preciso saber se a potência indicada é alcançada em toda a faixa, de 20 a 20.000Hz, ou apenas em parte dela), a impedância utilizada durante a medição, e por aí vai.

Ou seja, dependendo de como a potência foi medida, pode-se ter resultados finais distintos daquele que um usuário imagina ao comprar seu aparelho. No caso de um home theater, com 5, 6 ou 7 canais, é claro que a potência inicial se divide entre eles. É por isso que os bons fabricantes medem a potência “com todos os canais ativados”, e é aí que se conhece um bom receiver. Afinal de contas, a trilha sonora de um filme nunca traz sons apenas neste ou naquele canal, mas em vários canais ao mesmo tempo.

O amplificador – que pode ser um módulo à parte ou estar “embutido” no receiver – é o coração de um sistema de áudio. O sinal que sai do DVD player é do tipo line-level (sinal de linha), sem amplificação. Para ser reproduzido pelas caixas acústicas, ele passa pelo estágio de pré-amplificação, dentro do receiver. E, como todos os canais contêm sons do filme, quanto melhor for a performance desse estágio, melhor o resultado final.


Regra geral, um amplificador multicanal modular possui estágios internos superiores aos de um receiver. Tomando por base os modelos hoje à venda no mercado, os receivers mais potentes atingem a faixa de 150W em cada canal, enquanto os amplificadores chegam a oferecer 350W. Mas, como dissemos, isso não é tudo. É preciso checar outras características do aparelho, como construção, acabamento, tipos de conectores, fonte de alimentação, nível de aquecimento etc.

Num sistema ideal, há um amplificador para cada canal – um home theater 5.1 seria algo como cinco amplificadores mono trabalhando em conjunto. Mas, na prática, utiliza-se um receiver ou amplificador identificado como 5CH, o que significa cinco estágios internos de amplificação; pode-se montar o sistema também com dois amplificadores: um 3CH para os canais frontais e outro, estéreo, para os canais traseiros. Esta última configuração tem a vantagem de você poder ir fazendo o upgrade conforme o número de canais exigido: se quiser passar de um sistema 5.1 para um 7.1, por exemplo, bastará acrescentar mais um amplificador estéreo.

O receiver é mais usado por razões de custo: é mais barato um módulo de cinco canais do que cinco módulos mono, certo? Isso nos leva à questão crucial: de quantos watts necessitamos para ter uma boa qualidade de áudio? A resposta é: depende. Entram nessa avaliação as dimensões e características acústicas da sala, e até os gostos do usuário (certas pessoas adoram ouvir tudo em volumes altíssimos, algo que particularmente considero prejudicial ao conceito de entretenimento).

A maioria dos receivers à venda atualmente varia entre 65 e 200W de potência de saída. Podemos dizer que isso atende a praticamente todos os tipos de sala. As variantes principais são o tamanho e a capacidade de absorção sonora do ambiente. Uma sala “morta”, como se costuma dizer, é aquela que absorve muito o som, geralmente em função do uso de amplos estofados, cortinas de tecido grosso e grandes móveis de madeira (estantes com muitos livros, por exemplo).

Se sua sala é desse tipo, saiba que você vai precisar de muita potência. Retirando (ou reduzindo) os estofados e a madeira, pode-se trabalhar com menos potência. Mas é preciso ainda ser observado o tamanho da sala, medido em metros cúbicos (m3). Se o pé-direito é superior a 3m, você também vai precisar de mais potência.

Mas cuidado: as potências do receiver e das caixas acústicas têm que ser equilibradas. Quando falta esse equilíbrio, dois problemas podem ocorrer: distorções no som e danos aos alto-falantes, que em casos extremos podem até queimar.

De modo geral, recomendamos um bom investimento em receiver (ou amplificador) de alta potência, ainda que sejam mais caros. Por que? A potência de saída indica a capacidade do aparelho conduzir mais corrente elétrica às caixas acústicas. É essa corrente que faz os cones dos falantes se moverem para criar som. Quando falta potência ao receiver, o som se torna forçado, “duro” ou até distorcido. E você perde a dinâmica e o impacto dos bons filmes.


Mas, se a potência do receiver for muito mais alta que a suportada pelas caixas, você terá desperdiçado dinheiro. E isso é tão importante quanto observar um outro aspecto das especificações de uma caixa acústica: a sensibilidade (em inglês, sensitivity). Ela indica quanto da corrente elétrica fornecida pelo amplificador é de fato convertido em som. A sensibilidade é medida em decibéis por watt em um metro.

Para ter uma idéia de como isso afeta a qualidade sonora, basta dizer que uma diferença de 3dB corresponde a 50% da potência. Em outras palavras: uma caixa com 90dB precisa de apenas metade da potência exigida por uma com 87dB, para produzir o mesmo volume sonoro.

A vantagem disso é que, se suas caixas são de alta sensibilidade (acima de 89dB), você pode utilizar receivers de potência mais baixa para atingir o mesmo resultado. Portanto, da combinação entre esses fatores (potência, sensibilidade, tamanho e acústica da sala) é que se chega a um bom sistema de home theater.

Existe um método para calcular a potência ideal a uma sala? Sim, isso pode ser feito “in loco”, usando-se instrumentos de medição como o decibelímetro (também chamado SPL meter, ou “medidor de nível de pressão sonora”). Mas não existe fórmula mágica.

O importante é saber que um bom sistema de caixas deve ser capaz de responder a toda a potência de saída do amplificador ou receiver. Quando a amplificação é insuficiente, os picos sonoros de um filme (como explosões, tiros e ruídos de naves espaciais) e os efeitos especiais perdem impacto. Mais do que isso: perdem aquela naturalidade que nos envolve e nos faz mergulhar na ação.

Como costumamos dizer, é o filme que precisa ser visto e ouvido, não o equipamento. Quando isso não acontece, a maravilhosa ilusão do cinema vai embora.

*O autor é editor da revista americana The Absolute Sound, além de autor dos livros “Home Theater for Everyone” e “The Complete Guide to High-End Audio

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